Pesquisadores
da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) comprovaram que a bactéria Wolbachia, quando
presente no mosquito Aedes aegypti, é capaz de
reduzir a transmissão do vírus zika. Publicado em 4 de maio, na prestigiada
revista científica Cell Host & Microbe, o
estudo integra o projeto Eliminar a Dengue: Desafio Brasil.
Trazido ao país pela Fiocruz, o projeto estuda o uso da bactéria Wolbachia como
uma alternativa natural, segura e autossustentável para o controle de dengue,
chikungunya e zika. A pesquisa traz, ainda, dados inéditos sobre a capacidade
da Wolbachia de reduzir a replicação do vírus no organismo do mosquito. O
projeto conta com a participação de pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz
(IOC/Fiocruz) e do Centro de Pesquisas René Rachou (Fiocruz-Minas).
O estudo usou quatro grupos de mosquitos Aedes
aegypti: duas gaiolas continham mosquitos Aedes
aegypti com
Wolbachia, criados em laboratório pela equipe do projeto, e duas gaiolas com
insetos sem a bactéria, coleados no Rio de Janeiro. Todos eles foram
alimentados com sangue humano contendo duas linhagens do vírus Zika circulantes
no Brasil: metade das gaiolas recebeu sangue com uma cepa isolada em São Paulo,
enquanto a outra, com cepa isolada em Pernambuco.
Os
cientistas acompanharam os mosquitos ao longo do tempo. Depois de 14 dias do
contato com o vírus, os especialistas coletaram amostras de saliva de 10
mosquitos com Wolbachia e de 10 mosquitos sem Wolbachia. O objetivo era
infectar 160 Aedes e analisar se eles seriam infectados pelo vírus presente nas
salivas. O resultado foi animador: nenhum dos 80 mosquitos que recebeu saliva
de Aedes com Wolbachia se infectou com o vírus Zika. Por outro lado, 85% dos
mosquitos que receberam saliva de Aedes sem Wolbachia ficaram altamente
infectados.
“Por mais
que a saliva dos Aedes aegypti com Wolbachia apresentasse partículas
virais de Zika, em nenhum caso a saliva foi capaz de infectar outros mosquitos.
Esses dados são similares ao efeito anteriormente observado sobre o potencial
de transmissão do vírus dengue por Aedes aegypti com Wolbachia. Isso nos mostra que o
uso de mosquitos Aedes aegypti com Wolbachia também tem potencial para ser
utilizado para controle da transmissão do vírus Zika”, destaca o pesquisador
Luciano Moreira, coordenador do estudo e líder do projeto Eliminar
a Dengue: Desafio Brasil.
Na
competição interna, mais vitórias da Wolbachia
Para
verificar se o vírus Zika conseguiria se disseminar pelos tecidos dos
mosquitos, amostras de abdômen e cabeça/tórax foram analisadas por meio da
técnica de RT-PCR. Para isso, foram analisados quatro grupos de 20 insetos com
e sem Wolbachia, em dois momentos. Sete dias após a ingestão do sangue
infectado com a cepa de Pernambuco, os especialistas constataram que no grupo
de insetos com a bactéria, em relação ao de mosquitos sem a bactéria, houve uma
redução de 35% na replicação do vírus Zika no abdômen e de 100% na cabeça/tórax.
Catorze dias após a infecção inicial, as reduções foram de 65% e 90%,
respectivamente. No grupo que recebeu sangue infectado com a cepa de São Paulo,
após sete dias, as reduções atingiram os índices de 67% e 95%, no abdômen e na
cabeça/tórax, e 68% e 74%, nos mesmos tecidos, após catorze dias.
“Ainda não se sabe o que acontece no
organismo do mosquito com Wolbachia quando ele é infectado com o vírus Zika,
por exemplo. No entanto, percebemos que nesta competição a bactéria leva a
melhor. Ela consegue reduzir a replicação do vírus”, avalia Luciano.
O estudo foi além: os pesquisadores coletaram amostras de
saliva de 20Aedes aegypti com Wolbachia e de 20 Aedes
aegypti sem
Wolbachia que receberam sangue infectado com a cepa isolada de Pernambuco. Esta
coleta aconteceu 14 dias após a ingestão do vírus, período em que, segundo a
literatura, o patógeno já teria se espalhado completamente pelo organismo do
inseto e chegado à glândula salivar. O objetivo era demonstrar o percentual de
vírus que conseguiria chegar até este estágio, momento em que o Aedes se torna
capaz de transmitir o vírus. Aqui, mais um resultado animador: em 55% dos
mosquitos com Wolbachia não havia positividade para o vírus Zika.
“Na natureza, ao picar um indivíduo
infectado, o mosquito também se infecta. O vírus, então, irá percorrer um longo
caminho por todo o corpo do inseto até chegar à glândula salivar. Alcançar um
resultado que demonstra que mais da metade dos Aedes com Wolbachia sequer
apresentarão Zika na saliva, caso sejam infectados, reforça ainda mais o
potencial de utilização em larga escala que esta estratégia apresenta”, pondera
o coordenador do projeto no Brasil.
No país, a iniciativa sem fins-lucrativos teve início em
2012 e realiza estudos de campo nos bairros de Tubiacanga, na Ilha do
Governador, na Zona Norte do Rio de Janeiro, e em Jurujuba, em Niterói. O
resultado mais recente divulgado pelo projeto mostrou que 80% dos mosquitos Aedes
aegypti destas
localidades possuíam a bactéria Wolbachia, ao final dos estudos de campo
realizados entre agosto de 2015 e janeiro de 2016.
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